quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

Despedida

Tomé e Bento brincando de esconde-esconde (arquivo/2017)
Não, não é um título de impacto. Estou me despedindo mesmo. Do blog Bendito Espectro e da página do Facebook que me possibilitou o contato com pessoas e histórias emocionantes e permitiu que eu apresentasse um pouco da história da minha família desde que o autismo do meu filho Bento se revelou para nós, pouco antes dele completar três aninhos, em 2015.

Neste mesmo ano iniciei um blog em modo privado, só eu lia o que escrevia, uma espécie de diário, registro, para aprender a lidar com tanta coisa nova, tantas descobertas que me tiraram o sono antes de meu coração sossegar no sossego do entendimento. Sim, ainda me pego em desassossego por motivos novos, por motivos antigos que renascem, por fragilidade. Quando lhes disserem que o autismo é uma montanha-russa acreditem, porque é verdade.

Meses depois de iniciar a escrita, avaliei que seria bom compartilhar o conteúdo que estava gerando, uma chance de aprender no coletivo, conversar com outras famílias, abrandar a solidão dos primeiros tempos. Não foi uma decisão fácil, redes sociais geram a exposição de pessoas e sentimentos e quase nunca é simples dosar. As palavras que escrevo e publico são minhas, mas a vivência é conjunto. Procurei respeitar limites e acredito que me saí bem na maioria das vezes. Avalio positivamente minha presença nas redes, embora ainda hoje não saiba lidar bem com elas enquanto ferramenta – e me atrapalho toda.

Em 2017 minha família se mudou do Nordeste para o Sul, foi algo brusco para nós – dois guris, uma mulher, um homem e uma gata – e é claro que a vida real engoliu um pedaço enorme da vida virtual, que já era pequenininha. Filhos crescendo, terapeutas, escolas, profissões, clima, trajetos, finanças, saudade, (…), tudo passou a depender de uma nova reação, de um novo olhar, uma nova configuração.

Mesmo tentando postar com um prazo razoável, o blog ficou meio às moscas, fiz postagens no Facebook cujos comentários de muitos usuários jamais tiveram respostas, alguns foram lidos apressadamente, outros não foram lidos – com o perdão da verdade. Não é dessa maneira que gosto de me relacionar nem com as pessoas nem com o que produzo. O fato é que produzi bastante e considero a decisão de parar digna como a decisão de começar.

Bento e Tomé estão crescendo a jato, cada qual com suas demandas. Agora mesmo, um está em fase de perder os dentes de leite e o outro de desfraldar. Ah, sem esquecer as férias escolares. Estou aqui sentada escrevendo esse post de despedida, mas poderia estar penteando o cabelo, tomando um banho decente, esticando as pernas amarelas e peludas no sofá, com um livro nas mãos até cochilar, pois já são mais de dez da noite e eles dormem como meninos cansados de folia ou só recarregam as baterias para amanhã. E me desculpem o gerundismo, já fiz coisas piores (risos).

Talvez eu esteja querendo descansar um pouco e como há muitos itens na minha lista de prioridade que jamais poderei riscar, vou mesmo deixar que a corda se arrebente deste lado mais imaterial, que é o universo virtual. Ratifico o “riscar”, pois o que vivemos não merece ou pode ser apagado, por isso o que gerei de conteúdo permanecerá para eventuais consultas, partilha, enfim. Não pretendo alimentar outros perfis em redes sociais.

Obrigada pelo carinho, pelo respeito e admiração que trocamos neste período. Bento e Tomé saberão de vocês e do papel que tiveram em nossa jornada.

Tentem a felicidade!
Isolda.

p.s.1: deixo links para blogs com a temática maternidade e autismo que amo muito e gostaria que seguissem – se já não seguem. Detrás deles, duas mães sensíveis e antenadas, Fausta e Andrea, as melhores! Mundo da Mi http://mundodami.com/ Lagarta Vira Pupa http://lagartavirapupa.com.br/ p.s.2: deixo meu e-mail, porque sou assim mesmo, quase analógica e até mando carta (risos), isoldaherculano@hotmail.com

segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Ter um irmão com TEA/autismo

Desejem, filhos, desejem (arquivo/out.2017)
*
- Bom dia, Tomé!
- Bom dia, mamãe. Você sonhou com o que?
- Eu sonhei que estava viajando de avião. E você, filho?
- Eu sonhei com o Bento.
- Que legal, filho, sonhar com o irmão. E o que o Bento estava fazendo?
- Ele estava na terapia.
*

Esse diálogo entre Tomé e eu foi travado semana passada, assim que acordamos. Tomé é meu filho caçula, tem 2 anos e 4 meses – é uma criança típica. Bento, o mais velho, fez 5 anos recente – é autista leve, asperger.

Bento e Tomé têm diferenças óbvias, que não se resumem à neurodiversidade, claro, são o somatório da fase, do temperamento, das preferências etc. Em casa, procurarmos levar em consideração o fato de serem diferentes para tomarmos decisões também baseadas em quem eles são e não somente no fato de serem irmãos. Ou seja: se um está no judô, não necessariamente os dois precisam estar – são livres para mostrar suas aptidões e a partir da nossa leitura sobre essas aptidões decidimos esporte, outra ocupação, enfim. É o nosso jeito de conduzir o barco. Não buscamos uma fórmula para nada, vamos tentando ser felizes em nossas dificuldades, lembrando sempre que a vida é dinâmica, portanto, não há garantias.

Os dois estudam em escolas diferentes, pois no início do ano Tomé não tinha a idade mínima de 2 anos para ser admitido na escola de Bento. Como cada um teceu seus laços de afeição na escola em que está atualmente não tomamos como obrigatório matriculá-los no mesmo local ano que vem. Claro que é uma tentação. Seria mais cômodo para nós, um ficaria mais perto do outro, ganharíamos um desconto vagabundo, que seja, mas... Com ambos afeiçoados as próprias e diferentes escolas, escolher, nesse momento, seria favorecer um deles em desfavor do outro no que tange à individualidade. É claro que em vários momentos da vida não dá para escapar do favorecimento, porém, quando dá é essa nossa alternativa em família.

O que preciso admitir aqui é: quando falo em favorecimento, entendo que, apesar de tentar ser justa a maior parte do tempo, Tomé acaba tendo a rotina mais influenciada pela rotina do irmão e, muitas vezes, prejudicada porque está comigo esperando a sessão de terapia do Bento acabar, uma aula de natação, uma atividade estruturada em casa que não lhe inclui ao invés de estar dormindo, fazendo suas próprias atividades, atrapalhando o irmão sem que interromper pareça fatal... Confesso que é difícil balancear no dia a dia, pois ele percebe que o tipo de atenção dada ao irmão é outra e me cobra geralmente com desafios e situações que me tiram do sério. Eu entendo a posição de inconformismo dele, do alto dos seus 2 anos de idade, percebo o quanto já reage a isso com um instinto de domínio sobre as situações, comportando-se como se fosse ele o irmão mais velho. Também sinto que Tomé absorve bem mais prontamente meu estado emocional instável e temo que no futuro esse combo lhe faça mais mal do que bem.

Já li alguns artigos, embora sejam raros, sobre o impacto de ter um irmão com TEA/autismo (vou disponibilizar o link para dois deles ao final desse post) e em uma dessas leituras encontrei um dado interessante, embora não confortável. De que “um alto nível de sintomas de depressão materna também estava associado a níveis mais altos de sintomas de depressão e ansiedade nos irmãos sem TEAs”. Sim, é mais um ponto para nossa cota de culpa materna, contudo, faz sentido e nos serve de orientação.

Atenção se o filho não-autista é uma criança que desde cedo precisa encarar o fato de que a) seu irmão tem necessidades específicas (e essas dificuldades nem sempre são discutidas com naturalidade em casa), b) vê seu amadurecimento acelerado e precisa assumir responsabilidades incomuns para a idade, c) convive com uma mãe que pode estar deprimida, possivelmente, por se sentir incapaz dentro de muitas demandas. É muito para uma criança, não acha? Mas, os resultados dessa operação nem sempre aparecem na infância. A tendência é que em irmãos neurotípicos de indivíduos com TEA sintomas de depressão e comportamentos-problema se acentuem na adolescência, afirma um dos estudos.

Voltando ao sonho do meu pequeno Tomé, com o qual iniciei esse post, embora o diálogo tenha soado até engraçadinho, não preciso fingir que não denota uma tensão. As pesquisas já reconhecem isso, o que é bom, e sugerem a necessidade de intervenções que contem com a participação dos irmãos não-autistas, a identificação de estratégias e/ou recursos que possam ajudá-los a lidar com situações estressantes, porém, é tudo muito prematuro, um mundo ainda precisa se abrir nessa direção. Quando isso acontecer, quem sabe sentiremos o alívio de ter sempre apontado o leme para a lado certo, sem bússola, guiados só pelo amor e a intuição. Caso contrário, que haja ainda muito mar para navegar. 

Bento e Tomé têm um amor transcendente um pelo outro, é incrível vê-los juntos brincando, fazendo qualquer coisa ou nada. Sendo o que são: irmãos.
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Artigos citados:


quinta-feira, 24 de agosto de 2017

Um texto longo e sofrido sobre autismo, depressão e maternidade

Google Imagens
Eu sei que há muitas mães sofrendo agora, nesse momento mesmo em que escrevo. Arrisco dizer que a maioria delas está sofrendo sozinha, na solidão de seus medos, vergonhas, planos interrompidos. Também arrisco dizer que a maioria das que tem uma criança em investigação ou com diagnóstico de autismo acredita que a razão desse sofrimento todo é o autismo em si. Tudo mudou desde que essa palavra começou a rondar a vida delas; tudo mudou entre a negação e as visitas anônimas a sites sobre o assunto e blogs de mães de autistas; tudo mudou enquanto insistiam no ar de total normalidade. Então, embora eu já tenha adiado a escrita desse texto milhões de vezes, talvez seja a hora de dizer com todas as palavras que sou uma mãe como vocês, que passei e ainda passo pelas mesmas angústias e que, quem sabe, juntando a minha solidão com as suas, eu me sinta menos só e vocês sintam o mesmo.

Preciso começar dizendo que quando vieram as primeiras desconfianças de que Bento, à época com pouco mais de 2 anos, tinha alterações no desenvolvimento compatíveis com o quadro de autismo eu estava grávida do meu segundo filho, Tomé. Como se pode intuir a partir dessa informação, tive uma gravidez tensa, angustiada e com pouco ânimo. Eu sabia nada de autismo e optei por não dividir minhas desconfianças com ninguém – afinal, até eu desconfiava delas. Dei um pouco de tempo ao tempo (pouco mesmo, poucos meses) e fui me munindo do máximo de informação que conseguia, lembrando de vez em quando que era uma mulher grávida, para me obrigar a parar e respirar.

Chegou um ponto que meu ânimo com a gravidez estava tão baixo, embora fosse tudo bem comigo e com o bebê planejado, que meu obstetra percebeu algo errado. Em conversa com ele, sem mencionar autismo, contei de algumas coisas estranhas que estavam acontecendo comigo: a todo tempo eu tinha medo de morrer, medo que meus filhos morressem, tinha medo de pegar o carro e sair, pois sempre imaginava que sofreríamos um acidente ou seríamos assaltados, sequestrados, assassinados, coisas do tipo. Nessa época eu deixei de ter sonhos quando dormia e passei a ter exclusivamente pesadelos.

Ele me encaminhou para uma psicóloga que era especialista em conflitos na maternidade, disse que eu estava precisando de acompanhamento e que as coisas que sentia não eram incomuns como eu pensava. Coloquei o cartãozinho na bolsa. Resultado: não fui à psicóloga coisa nenhuma e durante as consultas de rotina da gravidez fingi ter melhorado. Na verdade, estava tão angustiada que até vínculo com meu bebê ficou difícil estabelecer. Dividi um pouco da angústia com meu marido, que me apoiou, mas eu estava a poucos meses de parir e direcionamos o foco para esse momento. Minha família inteira mora muito distante (Pernambuco), a família dele também (Ceará) e ele trabalhava demais nesse período, sendo uma ausência constante para nós durante a gravidez e durante o primeiro ano de vida de Tomé. Fui literalmente engolida pela solidão até que Tomé nasceu e, então, solidão e cansaço físico se misturaram de um jeito que eu me perdi totalmente de mim.

Com poucos meses de vida de Tomé, Bento começou as terapias (fonoaudióloga, terapeuta ocupacional e psicóloga), sugestão de uma ótima psiquiatra infantil que conhecemos. Essa psiquiatra de gente pequena notou minha imensa agonia de gente grande só de conversar comigo e me indicou um colega. Pela segunda vez peguei a indicação e nunca procurei o profissional. Era uma espécie de autossabotagem, porém, eu não percebia. Achava o seguinte: quem precisa de ajuda é meu filho, não eu, e não podemos gastar dinheiro com isso. Quando o terceiro médico, a pediatra de Tomé, disse que eu precisava me tratar, escutei com um pouco mais de seriedade. Não podia ser coincidência. Como eu tinha plano de saúde, resolvi buscar no catálogo do convênio um profissional por acaso. Encontrei vaga numa psicóloga que encaixava certinho no horário em que Bento estava na fono; se tudo corresse bem conseguiria dar um pulo lá e voltar para buscá-lo a tempo.

Foi nesse consultório, em dez sessões de trinta minutos cada, que tive certeza que quase toda angústia que o autismo do meu filho fez despertar já estava em mim eu não percebi. Estava na solidão que eu cultivava a anos, na falta de amigos, familiares e vida social. Estava no abandono da vida profissional, na ausência de autoestima, na eterna espera que tinha se transformado meu casamento. Foi lá que olhei para mim e vi que tinha deixado de ser uma pessoa e me tornado uma máquina de cumprir tarefas e que nenhuma dessas tarefas me incluía como beneficiária direta. Lá me descobri há anos sem ir ao cinema, há anos sem escutar uma música, há anos sem ler um livro ou escrever (lista de supermercado não vale!).

Quando o autismo chegou e tocou essa realidade com a fúria de um leão comecei a sofrer consequências psíquicas e físicas desse choque. Desenvolvi uma espécie de transtorno, e durou alguns meses, em que, por exemplo, eu descia e subia as escadas de casa várias vezes durante a noite para conferir se as portas e janelas estavam fechadas, mesmo muito cansada, mesmo sabendo que elas estavam fechadas sim. Ou voltava para conferir várias vezes se tinha acionado o alarme do carro, se tinha estacionado direito. Tantas vezes deixei de comer, almoçar principalmente, pois acreditava que a comida não passaria pela minha garganta, que eu não conseguiria engolir, que morreria sufocada. Uma severa queda de cabelo deixou uma cratera evidente no topo do meu couro cabeludo, um tipo de calvície que ainda tento reverter. E mais: percorri esse caminho quase sempre com um sorriso nos lábios, para que ninguém me percebesse daquele jeito e para que eu mesma não acreditasse no que sentia. Depois dessas dez sessões tão reveladoras não tive mais coragem de voltar à terapia, fugi como uma criança amedrontada, mas sinto uma gratidão sem fim pela psicóloga do plano de saúde que me ajudou em Maceió, em 2016, talvez meu pior ano, e também o que chamo de "ano essencial".

Ela me fez ver que provavelmente eu comecei um processo depressivo poucos meses depois do meu filho Bento nascer, que se arrastou pela gravidez e o nascimento do Tomé e pelo diagnóstico de autismo de Bento. Esse processo deve acomodar melancolias da minha infância e adolescência, inclusive. Eu fui uma criança e uma adolescente melancólica, sem dúvida, contudo, sempre com aquele sorriso nos lábios. Não foi o autismo que me trouxe tudo, agora isso é claro, mas quando o autismo chegou eu obviamente não tinha base de sustentação emocional para encará-lo (só achava que tinha) e precisava de um culpado exclusivo para aquelas peças mal encaixadas no meu jogo de tabuleiro imaginário. Hoje eu preciso buscar essa base que está em lugares acessíveis: em mim, na minha família, no meu ciclo de convívio, nas atividades que me podem devolver qualquer tipo de prazer, na arte, numa bandeira específica ou até numa refeição que já não temo engolir. Nem sempre consigo, tenho altos e baixos, como todo mundo.

Nesse processo de reencontro, a informação e a rede de conexões em que me sinto envolvida por conta do autismo agora me ajudam a compreender melhor as peculiaridades do meu filho e a me posicionar o mais confortável possível dentro dessa maternidade peculiar. Criar uma agenda positiva para o autismo, através de um blog como esse, é uma das minhas gambiarras terapêuticas e meu foco é realmente nas mães, por motivos óbvios. As mães precisam se sentir amparadas para amparar ou em caso de desmoronamento delas, tudo em volta desmorona junto, e a primeira vítima de uma queda brusca assim é, sem dúvida, o filho que necessita de mais cuidados.

Isso não quer dizer que o autismo dos nossos filhos, por si só, não nos meta todos os dias em picos de desânimo e até desespero; em especial, quando esse autismo está associado a outros fatores (biológicos, familiares, sociais) que criam enormes barreiras para o autista expandir suas formas de sintonia com ele mesmo, com as outras pessoas e com o mundo a sua volta. Quer dizer que quando esse desânimo e esse desespero chegarem terão uma força devastadora se encontrarem alguém já emocionalmente em fagulhas, prestes a explodir. Às vezes, o autismo parece a bomba, quando, na verdade, é o estopim. 

quinta-feira, 20 de julho de 2017

Autismo: que luta é essa?

E quem não lutaria por esse sorriso? (arquivo/2017)

Já escrevi algumas vezes sobre os sentimentos que me tomaram desde que comecei a desconfiar que o desenvolvimento do meu primeiro filho, Bento, corria fora dos trilhos. Solidão, medo, culpa, tristeza são alguns deles. Senti tudo isso, claro, e senti muito mais. Tive que me deparar com sensações que me deixam pouco à vontade hoje, quando relembro, e preciso me esconder delas na tentativa vã de acreditar que jamais existiram.

Foi devastador encarar a primeira vez a palavra autismo e de forma tão íntima, porque eu não sabia, em absoluto, do que se tratava e imaginava o pior. Minha capacidade de raciocínio deve ter atingido o nível mais elementar. O emocional e o instintivo assumiram, então, as rédeas – decerto, o que me salvou. Olhava meu filhinho na casa dos dois anos e ele importava, nada mais. Se o autismo era um desconhecido, meu filho não era. Mentalizei que nenhuma condição seria para mim mais marcante do que sua condição de filho, de ser que amo, e consegui sair da bolha que me encontrava no início, uma bolha de conceitos equivocados. Essa foi a minha luta número um, a luta particular.

Com sorte, nossa família encontrou, logo no começo da caminhada, excelentes profissionais, que nos ajudaram a compreender e a buscar a compreensão no fato do nosso filho ser uma pessoa única e de seu autismo também ser único. Eles nos disseram algo que faz bastante sentido: por mais que Transtornos do Espectro do Autismo (Tea) seja uma classificação para sujeitos com características comuns, as crianças com autismo têm sua natureza própria e estão em constante construção de identidade, como as outras. Hoje não é surpreendente para mim encontrar tantos autistas diferentes, com habilidades e dificuldades que variam tanto – até entre os classificados num único “grau”. Naquela época eu acreditava que autismo era uma espécie de “combo” e que autistas eram como crianças em série com os mesmos “itens de pacote”.

Sim, os itens de série existem. Eu posso enxergar no seu filho autista muito do meu filho autista, ainda que eles estejam localizados em pontos distantes no que definem como espectro. Talvez os dois gostem de pular freneticamente, de repetir frases feitas e tenham sensibilidade auditiva. E talvez só um deles desenvolveu leitura precoce, gosta de girar as rodas dos carrinhos de brinquedo, balança o corpo para frente e para trás. Cada uma dessas crianças acena para a família, a escola, o sistema de saúde, a sociedade etc. que tem uma demanda própria. A grande tentativa que me atiro todos os dias agora é essa: compreender as particularidades. É também esse meu esforço quando estou em contato com todo o raio de convivência do meu filho: que as particularidades sejam levadas em conta. Mas, a aceitação de que a pessoa com autismo não deve ser generalizada é difícil para a maioria. Foi essa compreensão que me levou à luta seguinte, a luta coletiva – cujo armamento, por exemplo, inclui esse blog.

Existem caixas no sistema educacional, caixas nas relações sociais, caixas no mercado de trabalho e caixas até no campo afetivo. Não “encaixar” é uma espécie de oitavo pecado capital. Crianças que não “encaixam” (e entre elas há um universo infinitamente maior que o universo do autismo) foram por muito tempo relegadas à vala funda da exclusão, e infelizmente continuam a ser. Hoje, mesmo que inclusão seja mais uma palavra da moda do que uma prática, temos a oportunidade de lutar para que a adaptação (de conteúdos e situações) exista e permita que indivíduos com potencial diferente possam contribuir num grupo, cada qual a sua maneira. Não foi sempre assim e não viemos parar aqui por sorte ou acaso, há muita gente engajada nessa luta, porém, há também muito espaço vazio precisando ser preenchido.

A luta pela escola inclusiva, pelo mercado inclusivo, pela comunidade inclusiva, pelos meios de comunicação inclusivos, pela família inclusiva, não é uma busca de favorecimento à pessoa com deficiência em detrimento das demais, como tantas pessoas físicas e jurídicas (!) entendem e querem fazer entender. Essa é uma luta por oportunidades justas de aprendizagem, trabalho e convivência social. Tão importante quanto saber usar as armas certas (coragem, conhecimento, amparo legal) é ter capacidade de desarmar o oponente, desarmá-lo do preconceito.

Para isso, não precisa ter um blog, lançar um livro ou estar na tevê. Mas, precisa sair da bolha. Dizer para si, para os outros e para os próprios autistas (há pais que nunca disseram a seus filhos o nome da sua condição): o autismo existe e está aqui. Dizer: meu filho é autista e vai à escola regular ou especial, às festinhas da família, aos clubes, aos parques, às oficinas de arte, às modalidades de esporte, aos shoppings centers, à igreja, à busca do emprego... E não o discurso contrário. Esse parece o primeiro passo. E antes que alguém pergunte “é só isso?”, advirto: sim, e vai ser difícil.  

quarta-feira, 7 de junho de 2017

Meu filho diferente

Fonte: Google Imagens.

Durante o final de semana encontramos um coleguinha de turma do Bento numa lanchonete. Eu adoro conversar com esses pequenos, que acabam me passando muita informação sobre a escola que não obtenho do meu próprio filho, por sua dificuldade óbvia de comunicação. Através deles, fico sabendo de forma mais solta – não apenas pelos relatos profissionais – que ele sai da sala de aula com frequência, deixa de prestar atenção a qualquer coisa para ler gibis etc.

Na lanchonete, papai Julio e eu estávamos sentados escolhendo o pedido, enquanto Tomé (meu mais novo) e Bento já brincavam no espaço kids. O coleguinha chegou de mansinho, falou com Bento, que não respondeu. Percebendo o imbróglio fui lá intermediar – mães de autistas são intermediadoras natas. Eu conhecia o menininho de vista, só não sabia que ele era da turma do meu filho, achei que estivesse uma à frente, coisa que o menino me esclareceu de pronto, dizendo ser da mesma sala e ter a mesma professora, claro. Resolvido o mal entendido, perguntei ao pequeno, quando já estávamos à mesa lanchando, como era o Bento na sala de aula. 

- Ele é diferente dos outros.

Bem, eu sei que meu filho é diferente, mas a frase saindo da boca daquela criança ainda me causou algum espanto, muito espanto na verdade. Bento estava do nosso lado e só ouvia, sem reagir ao que era dito. Instiguei um pouco mais: ele é diferente, como?

- Ele não fala com ninguém. Só às vezes.

Não preciso mentir ou dizer que isso não bateu forte em meu coração. Bateu. E no do pai também. Nosso filho é diferente. Nós sabemos disso. Os médicos e terapeutas sabem disso. A escola sabe disso. Todas as pessoas a quem posso atingir com minha vivência (dentro ou fora do nosso ciclo social e familiar) sabem disso. As outras crianças sabem disso. Não é novidade para ninguém, porém, a pergunta que não quer calar é: o quanto ser diferente vai fazer diferença na vida do meu filho? Essa questão, formulada pela minha própria ansiedade, jamais será respondida sem que eu tenha que apelar para a futorologia. E futuro é um brinquedo que não está em nossas mãos. Existe o presente, é só com ele que podemos brincar. 

Muitas outras coisas foram ditas naquela mesa, o pequeno era um verdadeiro tagarela, como a quase totalidade das crianças da classe de Bento. Sempre estimulado por minhas perguntas, ele revelou que Bento gosta muito de parquinho e de maçã, além dos gibis, e sobre rotinas da escola. Quando a conversa começou a ficar chata, tipo conversa de adulto, as crianças voltaram para a ala infantil. Bento deitou naquela posição clássica que vários autistas, e não somente autistas, gostam de brincar (como a foto que ilustra esse post), ele tinha um boneco nas mãos. O coleguinha, então, posicionou-se da mesma maneira para iniciar a tentativa de interação. Vejam bem, a criança típica sem nenhum treinamento prévio sentiu a criança atípica. Ela sabe que meu filho Bento é diferente e, por instinto, ela também sabe que as diferenças dele não inviabilizam suas relações. Em pouquíssimo tempo os dois estavam brincando de luta, cada qual com seu boneco. O colega investia em provocar (“bate o meu”) e Bento respondia batendo e rindo, não apenas por saber atender à instrução, a resposta vinha do fato de ele estar à vontade diante do outro para agir. Foi muito emocionante ver aquilo acontecer minutos depois da pressão das pequenas frases daquele garoto desconhecido e íntimo. 

Sim, já tive a fase de pensar que meu filho não teria amigos. No começo de tudo, pois ele parecia não se conectar com os outros. Eu sempre interpretei que ele não queria essa ligação, só depois aprendi a ler nas entrelinhas, a perceber quando ele queria e não conseguia; quando ele precisava de ajuda, contudo, não sabia pedir ajuda, e quando ele estava reivindicando mesmo seu direito à solidão. Depois passei para a fase de pensar que ele terá amigos, mas poucos, talvez pouquíssimos, como eu mesma. E se você me perguntar: quantos? Diante dessa cena e de tantas cenas que a vida nos oferta todos os dias para que aprendamos a entender a existência de uma forma mais generosa, até tenho uma resposta pronta para quantos amigos meu filho terá: todos os que verdadeiramente importam. 

segunda-feira, 15 de maio de 2017

Autismo: corrigir ou adaptar?

Arquivo pessoal/2017
Tenho plena consciência de que entendo pouco de autismo, porém, entendo muito dos meus filhos. O filho é apresentado à mãe antes de ser apresentado ao mundo. O sentimento de maternidade precede o nascimento e passa por um aprimoramento que deve durar até o fim da vida. Esse é meu entendimento e a forma mais clara que encontrei para relembrar que a criança chega ao lar antes do diagnóstico de autismo. Antes de você conhecer o nome e a face da condição que possivelmente explica diversas das dificuldades de desenvolvimento do seu filho, as dificuldades já existiam. E você lidava com elas de forma correta, incorreta, com tranquilidade ou desespero.

Eu sempre trabalhei com a intuição em relação aos meus pequenos. Quando Bento começou a apresentar indícios de desenvolvimento atípico tentei ajudar como pude. As primeiras questões que apareceram foram sensoriais (como sensibilidade ao barulho), motoras (até hoje ele tem dificuldade de descer escada sem apoio, por exemplo), de linguagem (falava, contudo, não conversava) e de interação (dificuldade de se envolver com outras crianças). Havia pontos que eu não considerava tão problemáticos assim, apenas estranhava, pois não via outras crianças se manifestando daquela forma – parecia algo único e incompreensível: quando ele balançava as mãos freneticamente (flapping), dava “tchau” ao contrário (com a palma da mão voltada para o próprio corpo) e beijos sem estalo, por exemplo. À maneira materna ia tentando lhe orientar dentro disso tudo, até que ficou claro que não podia ser uma tarefa solitária. Eu precisava de auxílio e o primeiro passo devia mesmo ser buscar alguém que me ajudasse a compreender. Aí começou a peregrinação por especialistas. À medida que as respostas iam chegando percebíamos o volume das perguntas que tínhamos em relação ao nosso filhote. Eram muitas.

A convivência, que é anterior à chegada dos especialistas, vinha me mostrando que meu filho tinha uma maneira diferente de se apresentar frente a algumas questões. Foi preciso combater seu jeito diferente de ser – tentando moldá-lo – para descobrir que essa estratégia não era boa e também era um pouco desumana, pois não considerava seu ponto de vista. Isso quer dizer que se ele dava “tchau” ao contrário eu precisaria respeitar seu modo de dar “tchau”? Não é bem por aí. Talvez eu devesse me ater ao que estava antes do “tchau”. E antes do “tchau” vem a compreensão do “tchau”. Como assim? Bento tem uma maneira diferente de receber e assimilar as informações e também as instruções, como a maioria das crianças autistas. Ou seja: muito do que eu quero passar para ele tem que ser adaptado a essa maneira primeira de ver para depois reagir.

Foi preciso observar bastante meu filho acenando “tchau” para compreender que quando as pessoas davam “tchau” para ele o que ele imediatamente via era a palma da mão delas. Então, quando pensava em reproduzir o movimento ele também queria ver a palma da própria mão. Bento não apenas dava “tchau” com a palma da mão voltada para si mesmo, como fixava o olhar na palma, como que garantido que estava fazendo da maneira correta (ele é um tanto perfeccionista). Perceber isso foi minha mina de ouro. A terapeuta aconselhou treinar com ele o “tchauzinho” de frente ao espelho, pois, na imagem espelhada ele conseguiria ver quando a posição da mão estava de acordo. Eu acho um ótimo método, mas ele não compreendeu. O método que utilizei e foi muito eficaz foi me posicionar atrás do seu corpo, como uma sombra, e “guiar” a mão dele na hora do aceno (como mostra a foto que ilustra esse post). Sempre que percebia a intenção  dele de se despedir me posicionava detrás do seu corpinho, como uma chata, conduzindo por fora a direção da mãozinha. Usei o mesmo método para ele colocar a mão no peito se referindo a si mesmo como “eu” ou acenando algo como “meu”. E ainda uso, não tenham dúvida, a última vez foi para que ele entendesse o posicionamento da mão para subir um obstáculo no parquinho. Sou a famosa "mãe-sombra" com orgulho!

A compreensão do beijo sem estalo veio através da fonoaudióloga, que me explicou um pouco sobre essa leitura literal das situações. Quando ele via as pessoas trocando beijinhos e o estalo sair do encontro dos lábios de uma na bochecha da outra, a compreensão dele talvez fosse de que o barulho era algo automático, associado ao ato de beijar, não algo que se produz à parte. Ele só começou a entender esse mecanismo quando passamos a explicar claramente que encostar os lábios era um ato e produzir o barulho era outro ato. Ainda assim, no início da compreensão ele continuava a dar muitos beijos sem estalo. Aí, pedíamos, sem recriminar: agora um beijo com barulho, Bento. Ele tinha que processar um pouco mais para responder. Até que um dia entramos na era definitiva dos beijos barulhentos. 

Esses são dois pequenos exemplos que resolvi dar porque, ao entrar no mundo do autismo e das salas de recepção com outras mães de autistas, conheci muitas crianças como Bento, que também davam “tchauzinho” ao contrário e também davam beijos calados. E muitas de nós tentou corrigir esses hábitos antes de tentar entendê-los. Entender sempre deve ser prioridade. A correção não é a única via de aprendizagem, especialmente em casos em que não é necessário corrigir, "apenas" adaptar. 

terça-feira, 4 de abril de 2017

Autismo: nem sempre nem nunca


Meu marido, Julio, costuma reproduzir um velho jargão profissional que diz: em medicina, nem sempre nem nunca. Mas, é comum os médicos não conseguirem a temperança que a frase traz. E não por serem médicos, aposto que isso tem mais a ver com o fato de serem pessoas. É mais difícil ainda ser moderado quando estamos diante de uma situação extrema. O que é uma pena, pois é quando verdadeiramente precisamos da moderação.

Sim, uma das fases mais complicadas da minha vida foi perceber que meu filho era autista. A percepção chega antes do diagnóstico e geralmente nos encontra desprevenidos de tudo, inclusive de conhecimento. Ou, especialmente, de conhecimento. Não falo apenas de informação, pois existe muita informação por aí e a maioria é não-confiável. Já “conhecer” é fundamental para não sermos, de cara, soterrados pela insegurança e pelo medo. Como eu não tinha o conhecimento que busco hoje fui soterrada. Toneladas de terra caíram sobre mim e devo ter ficado um bom tempo imóvel, calculando se havia possibilidade de sair dali ou se o melhor não seria submergir de vez. Eu me via em solidão profunda.

Julio achava minha desconfiança um exagero, afinal, Bento era uma criança pequena e quando crescesse um pouquinho mais, começasse a frequentar a escola, turbinasse a vida social, aqueles pontinhos de tensão entre o desenvolvimento dele e o das demais crianças sumiriam. O discurso dele me foi repetido por pessoas conhecidas e até pela pediatra do meu filho que recomendou que EU buscasse um psiquiatra, pois EU precisava me tratar e se Bento tinha qualquer coisa de estranha em seus comportamentos e reações a culpa deveria ser MINHA. Ah, e é claro: aconselhou a não o deixar ver TV demais! Não preciso dizer que jamais retornei ao consultório dessa pessoa. 

Buscamos uma psiquiatra, sim, mas uma psiquiatra infantil e de lá saímos com indicação de estimulação especializada. Ele começou com fonoaudiologia e terapia ocupacional, depois entrou a psicologia. A essa altura Julio estava bem consciente da situação; nos apoiamos mutuamente, fomos nos fortalecendo dessa união e Bento começou um processo terapêutico que o ajudaria a se encontrar dentro de suas desordens sensoriais, sua dificuldade de interagir com outras crianças, seu modo atípico de se comunicar, entre outros. A reação positiva do nosso filho ao que lhe foi proposto terapeuticamente, sempre de forma lúdica, tem ligação direta com nosso entendimento de pais. Entender que ele é autista e que não deixará de ser foi nosso divisor de águas, com certeza. 

Lembro daquela época de ter lido num site sobre um jovem autista que era um gênio matemático, porém, não sabia amarrar os cadarços dos sapatos nem abotoar as camisas. Não é fácil compreender coisas assim, pois sempre nos tomamos como parâmetro, como se fossemos o centro do mundo. Achamos que o fácil para a maioria é o fácil para todos. Como assim uma criança ter extrema facilidade para modos complexos de raciocínio e uma trava enorme para atividades que de tão corriqueiras sequer chamamos de habilidade? É bem maluco perceber que temos preconceito quando achamos que estamos livres dele. Preconceito não é apenas não aceitar o diferente. Não atentar para que o diferente existe, não se dar ao trabalho de imaginar que há outras maneiras de pensar e agir, também é se fechar num mundo em que a diferença parece não existir ou é irrelevante. Também é preconceito. Para corrigir o preconceito é preciso se perceber dentro dele e ir saindo de fininho, porque dá vergonha mesmo.

Bento não é um gênio matemático. É meu filho, uma criança comum e diante da possibilidade de um dia não amarrar os sapatos – como vislumbrei lá atrás, ao ler a reportagem – o pai dele me apresentou uma solução bem simples. “Se Bento não conseguir amarrar os sapatos arranjaremos para ele sapatos sem cadarços. Se ele não conseguir abotoar a camisa, vestirá camisetas sem botões”. Foi tão importante ele ter me dito aquilo; aquilo me marcou profundamente. Não porque eu não deseje que meu filho adquira essas habilidades, desejo sim, como uma mãe qualquer desejaria, e trabalho por isso. Contudo, se não dermos espaço no nosso HD cerebral para pensar o autismo de alguma maneira que não seja a extremamente pesada a que já nos habituamos a pensar, perderemos um pedaço importante da infância dos nossos filhos e esse pedaço importante se perderá deles também. Nenhum desses pedaços será reposto depois, a vida não tem estoque. 

O pai do meu filho me ajuda a olhar para ele e ver as coisas de maneira mais leve. Isso, às vezes, irrita nosso olhar viciado de mãe-terapeuta, pois temos a tendência de acreditar que os maridos não ajudam e meio que atrapalham com o seu senso de simplismo, de acreditar que vai tudo bem, obrigado. Mas, será que eles só atrapalham? Não me refiro aqui aos homens que negligenciam ou abandonam suas famílias por conta de um diagnóstico; estou falando de pais de verdade.

Quantas vezes notamos que os filhos agem de maneira mais natural e solta na presença do pai do que na nossa? Será que não estamos cobrando demais dessas crianças e nos cobrando o triplo? Será que elas se sentem mais crianças quando estão um pouco afastadas da nossa patrulha materna? Isso não quer dizer que devamos abandonar nossas convicções e deixar a vida correr para onde o vento soprar. Quer dizer que a moderação também deve ser exercitada por nós mesmas, não é algo que sirva apenas para os outros. Será que enquanto damos lições diárias de responsabilidade extrema a nossos companheiros não podemos nos abrir para que eles nos ensinem um pouco sobre flexibilidade? Vai me dizer que não lembra do começo desse post? Na medicina, no autismo, na maternidade, no amor, na vida: nem sempre nem nunca. 

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