quarta-feira, 6 de abril de 2016

Sobre ser diferente

Diferente como eu / Google Imagens
Quando ouço falar de bullying - situação vexatória enfrentada por alguém fora de um padrão - lembro muito do meu tempo de escola na infância. A expressão não fazia parte do vocabulário cotidiano, como agora, mas o recurso da humilhação era o mesmo.

Ainda hoje eu sou estrábica, mas, em se comparando ao meu estrabismo quando criança/adolescente posso dizer que estou "curada". Tenho 31 anos e pessoas que me conheceram pequena perguntam se fiz alguma cirurgia corretiva - a resposta é não; acredito que o tempo foi o remédio. Remédio amargo, posso dizer. 

Por conta dessa diferença sofri muito nas mãos de crianças intolerantes - naquela época também não se usava o discurso de respeitar as diferenças. O habitual era por o dedo na ferida, um comportamento adulto que os pequenos reproduziam com destreza. Tive muitos apelidos, pensei muito em não ir mais à escola, em voar para outro planeta, fugi sempre de amizades (pois, muitos amigos conseguiam me magoar quando achavam conveniente, mesmo que fosse para pedir desculpas depois, dizer que foi brincadeirinha).

Curioso foi começar a ler sobre algumas das características do autismo e me identificar tanto. Sempre tive dificuldade de olhar nos olhos das pessoas e para fotos, por conta do estrabismo. Apesar de ter muitos colegas, tinha/tenho uma dificuldade imensa de fazer amizades mais próximas, devo guardar resquícios do bullying. Fui, e continuo sendo, aquela pessoa que quando procuram numa festa já foi embora - nem eu sei ao certo porque faço isso. Gosto de rotina, gosto das coisas no mesmo lugar, pequenos barulhos me são bastante incômodos. Talvez um médico hoje dissesse aos pais da criança que fui que ela tem algum transtorno de desenvolvimento. Contudo, era minha forma de reagir ao mundo.

Não culpo nenhuma daquelas crianças que me humilharam por ocasião ou o ano escolar inteiro. Digo isso hoje, pois, na época cheguei a desejar que todas morressem - me perdoem a franqueza e percebam como a intolerância é contagiosa. Talvez elas tenham uma parcela de responsabilidade também sobre algumas habilidades adquiridas na mesma época: a necessidade de introspecção, a concentração para ler, escrever, desligar-me do mundo real. Isso tudo eu tenho e utilizo bastante a meu favor. Infelizmente, com menos frequência do que desejaria - essa privação me faz mal, às vezes, fisicamente. O meu senso de defesa hoje é afiado também, sei me defender bem sem precisar sempre recorrer ao contra-ataque. Quando criança, essa não-capacidade me fez muita falta. Eu sentia culpa por ser diferente e a culpa jamais permitiu que eu reagisse, sequer pacificamente.

Alguns daqueles coleguinhas me pediram desculpas depois de adultos e eu fiquei extremamente incomodada, sem saber o que lhes dizer, quis novamente partir para outra dimensão, porém, o que aconteceu realmente foi: eu disse que os perdoava e pronto! E perdoei mesmo. 

Quando vejo as crianças de hoje celebrando as diferenças nas escolas junto a seus colegas diferentes, assumindo desde bem pequenas um senso de responsabilidade frente à diversidade das coisas, ensinando aos próprios pais a obediência de leis, a cortesia (...) me sinto absolutamente encantada. Sei que nem todas terão a oportunidade de ser assim (a educação doméstica prevalece quase sempre), mas acredito que a geração do meu filho está muito mais preparada para conviver com as diferenças do que esteve a minha. Isso me dá esperança. No futuro dele? Sim. Mas, mais ainda, no futuro da humanidade.

2 comentários:

  1. Meu filho está passando exatamente isso hoje com quase cinco anos não quer ir a escola pq os colegas batem e tiram o óculos zombam dele fui lá e reclamei conversei e hoje está melhor não muito mas melhorou bastante mas ele ainda tem receio de ir pra escola muito triste sabe que ja tem crianças com tal pensamento claro por culpa da mãe e do pai q não explicam sobre tais assuntos triste ver e passar tudo isso ele muito pequeno ja sofrendo mas tenho fé que vamos vencer o preconceito e junto com ele eu estarei sempre

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    1. Olá, mãe, que bom que l seu filho consegue conversar com você sobre isso. Eu me sentia tão humilhada e culpada que acho que jamais conversei com ninguém sobre isso. Esperei meus irmãos ficarem adultos para tocar no tema pela primeira vez e choramos juntos. Fortaleça a autoestima do seu pequeno sempre e ame-o muito, como você já faz! Beijos.

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