sábado, 6 de fevereiro de 2016

Culpa

Eu sou mulher, mãe, larguei provisoriamente a profissão para viver a maternidade. E sinto culpa. Culpa de ter deixado o jornalismo em último plano? Não. Também há mulheres que trabalham fora de casa e sentem culpa todos os dias. Eles são como eu. Fazem tudo e ainda acham que está faltando um pedaço. Deve ser encargo dos genes, não apenas cobrança social.

Então, quando o autismo entra para nossa família - como uma sentença de morte em vida - achamos imediatamente que a culpa é nossa: da nossa idade na gestação (jovem demais, velha demais), da nossa árvore genealógica, dos nossos hábitos alimentares, do nosso temperamento, da nossa sorte, da nossa fé. Qualquer mãe de autista já se viu em pelo menos uma dessas alternativas. Ou em todas elas. 

Hoje, pode ser que algumas de nós já aceite essas duas realidades: o autismo não é uma sentença de morte e as dores do mundo (inclusive, as do "nosso" mundo) não são culpa nossa. Outras ainda não chegaram a esse entendimento, continuam a se culpar. Estão lendo esse texto em silêncio e também sentem culpa de estar aqui, reconhecendo que esse drama é, sim, seu. 

Uma palavra de conforto para elas - e para mim: não é culpa sua! A culpa parece perfeccionismo, excesso de zelo, uma vontade inocente de acertar sempre, mas é, na verdade, pretensão. De acreditar que o bem e o mal que nos atinge é pura responsabilidade nossa, de nossas condutas e resoluções. Como se andássemos por aí com o controle remoto da vida nas mãos. 

O que a culpa não diz - ou não nos deixa ver - é que também temos parcela no mérito dos nossos filhos. Não, senhor! Não, senhora! Não é obrigação: é esforço, dedicação, além do muito, muito, amor. Onde eles vão chegar? Eu não sei. Nossos pais tampouco sabiam onde chegaríamos. Farão faculdade? Constituirão família? Terão amigos? Para o sim e para o não, cabe uma verdade: não somos nós - somente - quem determinamos isso. A vida de todos é um conjunto de elementos tão atrelados um ao outro que jamais poderemos enumerar, menos ainda, discriminar quem fica com o que. 

Gastemos nossa energia mental, pois, com pensamentos positivos, atitudes positivas. Vamos sentir, acreditar e seguir. No final de tudo, passaremos pela existência sem pelo menos uma culpa: a de ter perdido tanto tempo com bobagem.

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